Personagem de São João

Todo dia dona Zefa fazia seu bolinho especial e o colocava na janela de sua casa, para esfriar com o vento, e todo dia um moleque da rua, não identificado, roubava um pedaço do bolo. Intrigada com esse furto cotidiano, dona Zefa escolheu um dia para ficar atrás da janela e ver se descobria quem era o Fi da Bêba que roubava parte de seu bolinho especial, ao qual nunca dera nome.

Nesse dia, cinco minutos depois que um novo bolo estava na janela, lá veio o ladrãozinho em surdina. Pé ante pé, silencioso, um verdadeiro 007 dos bolos, esgueirando-se pela parede da boleira, com toda a calma do mundo, até que, no momento certo, meteu a mão imunda no bolo da dona Zefa. Esta, feito um tubarão branco que salta de dentro do mar sobre sua presa na superfície, saiu detrás da janela e agarrou o bracinho fino e miúdo do ladrãozinho gritando:

― Então era você, seu peste?! ― ao que o garoto não conseguiu responder, visto que havia perdido a fala e o sangue no susto, diante de uma plateia que assistia a tudo entre gargalhadas, no outro lado da rua. ― Dá próxima vez que quiser comer meu bolinho ― continuou dona Zefa ―, pede moleque, pede! Não rouba não, pede moleque!

A cena foi tão engraça ― dona Zefa ali, agarrada ao braço do garoto, o garoto esperneando e chutando o ar em todas as direções, na tentativa de se soltar da mulher enorme que o segurava, ciscando no chão feito frango antes do abate ―, a cena foi tão engraçada que daquele dia em diante o bolinho da dona Zefa passou a ter nome, e veio a ser conhecido como “Pede Moleque”, nome dado em homenagem ao ladrãozinho Fi da Bêba e a criadora de tão desejado bolo. Mas, com o tempo, o nome do bolo foi se modificando, modificando, até alcançar a forma que conhecemos hoje. E hoje nós o conhecemos como “Pé de Moleque”.

OBS.: Ouvi uma "estória" parecida, quando era criança, e resolvi dar uma leve adaptada.
Imagem: Tarsila do Amaral, A negra, 1923.