13/11/2011

novembro 13, 2011
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Recebi, esses dias, o mais recente livro de W. J. Solha: Arkáditch. Uma história que se passa em apenas 24 horas, num verdadeiro rebuliço na família de Zé Medeiros, protagonista da trama.

Nessas poucas horas, entre tantas outras coisas, uma moça misteriosa, Marion Morrison, surge e inferniza a vida da família, numa busca por vingar a morte de seu pai, Stiepán Arkáditch (mesmo nome do irmão de Anna Karenina, de Tolstoi), anos antes, em Moscou, supostamente pelas mãos de Zé Medeiros, paraibano culto e professor universitário de filosofia, além de cineasta, que fez fortuna com a venda de rapadurinhas, mas que nasceu pobre.

Misterioso, Zé Medeiros tem um passado nebuloso que vai se desenrolando aos poucos com as manobras de vingança de Marion. Na verdade Marion Morrison – pseudônimo de Adriana Saturnino, apelido: Drica –, já rondava a família há algum tempo: acompanhava o trabalho da outra Drica, Adriana Medeiros (coincidência entre os nomes e apelidos?), na Europa, filha de Zé Medeiros e violoncelista clássica, mundialmente famosa, que voltou ao Brasil, nesse momento, disposta a abandonar a carreira de musicista; foi amante de Fernando, marido de Iolanda, irmã de Drica Medeiros e dona de agência de publicidade; e por fim, deitou-se com Hélio, presidente do Sindicato dos Bancários, e filho de Zé Medeiros.

Enquanto se desenvolve a ação do livro, um filme, de Zé Medeiros, é rodado na cidade, e seu pai, esclerosado, está em sua casa, em tratamento. O que se torna um novo transtorno para nosso protagonista e sua família.

Quanto ao texto, este possui um toque de romance policial, porém, segundo Ivo Barroso, é mais do que isso, trata-se mesmo de um romance policial cult, como frisa neste bilhete enviado ao autor:

Você escreveu um belo romance policial cult, o que não é pouco, pois se trata de gênero difícil, mormente considerando que você introduziu nele a técnica do script cinematográfico, o que permite a visualização imediata das cenas e esconde, com o recurso dos cortes, o desenvolvimento linear da ação.

Como citado por Ivo Barroso, a forma de composição da obra, muitas vezes, assemelha-se a um script de cinema ou teatro, devido ao toque descritivo das cenas, enquanto sua linguagem, crua em certos momentos, está repleta de recursos, como o itálico, o sublinhado, o negrito e a símile, que “guiam” o leitor pelo texto.

Arkáditch também traz erudição nas discussões sobre arte, filosofia, política e história, inclusive a recente – o romance se passa nos anos de 1990, década do impeachment de Collor. E muitas passagens na obra, principalmente pela voz e pensamentos de Zé Medeiros, convidam o leitor a pensar, e podem, inclusive, chocar os mais sensíveis ao ler frases que, por exemplo, perguntam “Como Deus criou prazer tão poderoso, como o sexual, sem nenhuma experiência pessoal?” (p. 11, grifo do autor), ou quando sentencia numa sala de aula,

fomos todos programados para nos preservar, perpetuar a espécie... e pensar! pra evoluir!, o que me leva a crer, (...), que minha vida, a nossa vida, a sua – Gadelha – a sua – Pinheiro – tem um sentido, pois o Universo – Deus, caramba! – precisa de nós! (p. 151, grifo do autor).

Nesses dois trechos também podemos ver exemplos de uso dos grifos de que falei anteriormente, atraindo e guiando a atenção do leitor.

Mais à frente encontramos essa assertiva, agora da boca de Drica Medeiros, após ouvir elogios de Éric, seu irmão mais novo: “você só inveja o professor de educação física até o momento em que fica sabendo que o sonho dele era ser bailarino...” (p. 25). E em outra página, retornando às falas de Zé Medeiros, agora numa bela alegoria sobre o tempo, ele comenta com seus alunos:

Sabem qual a melhor imagem que conheço do Tempo? A do provedor de cinema! O passado acumulando-se numa bobina, enquanto o porvir – praticamente pronto – se desenrola da outra carretilha... e o presente, vivo, se projeta na tela, Tellus, Terra... (p. 92).

E assim segue o livro trazendo vários questionamentos dos personagens e de suas leituras, o que dá certa erudição à obra e instiga ainda mais a reflexão e atenção do leitor para as características psicológicas e comportamentais daqueles que estão envolvidos na trama.

Dessa forma, entre pensamentos e ações, chega-se ao último quarto do livro que possui um tom mais dramático, não por questionamentos existencialistas ou de qualquer outra natureza filosófica, mas devido às ofensivas de Marion e o desenrolar dos mistérios de Zé Medeiros, o que aumenta a curiosidade e a boa angústia do leitor pelo destino do protagonista; sensação que se mantém até à última página.

Para finalizar, uma notícia que satisfará a muitos leitores deste blog: Solha ganhou a bolsa Funarte de Criação Literária para produzir esse livro, e resolveu não vendê-lo, mas presenteá-lo a quem contatá-lo pelo e-mail wjsolha@superig.com.br, sem nenhum custo, inclusive de remessa. Não sei de quantos livros ele dispõe para envio, mas caso você tenha se interessado pelo Arkáditch, depois de ler esta breve resenha, entre em contato com o autor e procure garantir sua próxima leitura!



Sobre W. J. Solha: 
Solha é um escritor, cordelista, artista plástico, ator e dramaturgo. Nasceu em Sorocaba, São Paulo, mas está radicado na Paraíba desde 1962. É autor de vários romances, dentre eles Israel Rêmora (1975 – Prêmio Fernando Chinaglia, 1974); A Canga (1978 – 2º Prêmio Caixa Econômica de Goiás, 1975), A Batalha de Oliveiros (1989 – Prêmio INL, 1988); Shake-up (1997); Trigal com Corvos (2004 – Prêmio João Cabral de Melo Neto, 2005); História Universal da Angústia (2005 – Prêmio Graciliano Ramos, 2006, conferido pela UBE e O Relato de Prócula (2009 – Criação Literária da FUNARTE 2007, Prêmio UBE, Rio, 2010); chegando também a ser nomeado para o Prêmio Jabuti.

No teatro escreveu e montou A Batalha de OL contra o Gígante Ferr (1986), e A Verdadeira História de Jesus (1988). Escreveu também A Bagaceira (1982), Papa-Rabo (1984) e outras peças.

Além disso, fez outros trabalhos com música, como ator, pintor e roteirista de balé. Um histórico mais detalhado dos trabalhos de W. J. Solha e uma entrevista que concedeu ao escritor Nilto Maciel podem ser lidos no blog Literatura Sem Fronteiras.



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Livro: SOLHA, W. J. Arkáditch. João Pessoa: Ideia, 2011.
Imagem: capa do livro.


6 comentários :

  1. Ótima resenha. Deu vontade de ler o livro. Vou entrar em contato com o autor.

    Um abraço, William.

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  2. Fico feliz que tenha gostado, Letícia. Mas entre mesmo em contato com o Solha. Ontem mesmo conversei com ele por email, e sei que está disposto a presentear muitos livros.

    Um abraço!

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  3. Eita,saudade de uma boa leitura..Ganhar um livro?Já fico contente,por saber que existe um excelente autor,por aí,pq infelizmente,no quesito ganhar..ih..´só se for milagre!
    bjo,William.

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  4. Fui lá. Mandei o email. Pedi o livro. Aguardando!

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  5. Mas Mari, nesse caso não precisa de milagre, não é sorteio. Você só precisa enviar um email ao autor solicitando um livro que ele envia para você. Vamos lá, mande o email, rs!

    Um beijo!

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  6. Muito bem, Arlene! Que mulher direta!

    É bom ver meus leitores aproveitando a oportunidade de conhecer outro autor e interagir com ele depois de passar por aqui.

    Aguarde o livro, ele virá.

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