Apesar de ser um leitor viciado sempre acreditei que o que se acaba de ler deve ser primeiro maturado para se poder dar início a uma nova leitura; nunca concordei com leituras encadeadas sem assimilação, ou seja, nunca concordei que se entrasse em uma nova leitura antes de se ter refletido e entendido o que acabou de ler. E um dia eu estava lendo uma obra do filósofo alemão Schopenhauer, Sobre livros e leituras, quando descobri que eu não era o único a pensar assim; o filósofo concordava comigo. Dentre outras coisas, ele dizia:
“...aquele que lê muito e quase o dia inteiro, e que nos intervalos se entretém com passatempos triviais, perde, paulatinamente, a capacidade de pensar por conta própria, como quem sempre anda a cavalo acaba esquecendo como se anda a pé. Este, no entanto, é o caso de muitos eruditos: leram até ficar estúpidos. Porque a leitura contínua, retomada a todo instante, paralisa o espírito ainda mais que um trabalho manual contínuo, já que neste ainda é possível estar absorto nos próprios pensamentos. (...) Assim, não se chega à uma ruminação: e só com ela é que nos apropriamos do que lemos (...). Se lemos continuamente sem pensar depois no que foi lido, a coisa não se enraíza e a maioria se perde.”¹
Entendendo o que foi dito pelo alemão, ele não afirma que não devemos ler, que a leitura é nociva, mas que será inútil, e até mesmo prejudicial, se o leitor não parar para pensar o que leu antes de partir para um novo livro, se simplesmente acatar tudo o que acaba de ler, sem refletir ou contestar. Isso não seria justo com o autor, nem com o próprio leitor que não se permite a chance de compreender e elaborar idéias sobre sua vida e a sociedade a sua volta.
Atualmente tenho percebido pessoas lendo um livro atrás do outro, acabando uma leitura pela manhã e iniciando outra à tarde sem, sequer, ter assimilado a anterior. Isso faz com que ao final de dezenas de leituras nenhuma tenha se arraigado no leitor. O que não quer dizer que não se possa terminar de ler um livro hoje e hoje mesmo iniciar uma nova leitura, pode sim: se o leitor já refletiu e compreendeu o que leu.
Concordo que existem livros mais “cerebrais” do que outros, mas todo bom livro tem algo a dizer; e se o leitor gosta de escritores do calibre de Clarice Lispector, Hermann Hesse, Machado de Assis, Fernando Pessoa, Dostoiévski e outros, deve saber que a profundidade desses autores exige ruminação. Autores como estes não podem ser lidos e logo substituídos pelo seguinte. De que valeria toda a sua filosofia, todo o seu estudo humano e social se seus leitores os lêem como um entretenimento qualquer?
Então, considero importante que todo leitor procure deixar que suas leituras ganhem vida nos seus pensamentos; isso não fará com que ele leia poucos livros ― eu mesmo leio vários por mês ―, mas lhe transformará num leitor proficiente, sensato e dono de uma erudição importante para a sua relação com o mundo.
Boas leituras!
¹SCHOPENHAUER, Arthur. Sobre Livros e Leitura. Porto Alegre: Paraula, 1993.
Pintura: Franz Eybl (1806–1880). Lesendes Mädchen (Garota lendo), 1850. Pintor naturalista neo-clássico, nascido em Viena, na Áustria, com grande talento para descrever a natureza e a luz. Veja a forma como a luz é exibida na imagem e a perfeição das formas e cores, a cor da pele de menina, a cor de suas unhas, o brilho e a cor dos cabelos; observe tudo isso e saiba por que ele é considerado um dos melhores do período Biedermeier (termo que na Europa Central refere-se a trabalhar nos campos da literatura, música, artes visuais e design de interiores, no período entre 1815 (Congresso de Viena), o fim das Guerras Napoleônicas, e 1848, ano das Revoluções Européias, e contrasta com a época romântica que a precedeu).
Pintura: Franz Eybl (1806–1880). Lesendes Mädchen (Garota lendo), 1850. Pintor naturalista neo-clássico, nascido em Viena, na Áustria, com grande talento para descrever a natureza e a luz. Veja a forma como a luz é exibida na imagem e a perfeição das formas e cores, a cor da pele de menina, a cor de suas unhas, o brilho e a cor dos cabelos; observe tudo isso e saiba por que ele é considerado um dos melhores do período Biedermeier (termo que na Europa Central refere-se a trabalhar nos campos da literatura, música, artes visuais e design de interiores, no período entre 1815 (Congresso de Viena), o fim das Guerras Napoleônicas, e 1848, ano das Revoluções Européias, e contrasta com a época romântica que a precedeu).
Caro William, pertinente sua postagem. Válida, também, para os que escrevem. Temos que sedimentar nossos textos antes de passarmos para o(s) próximo(s). Ou pelo menos fazermos releituras antes de o(s) levar ao público. Abraços, Pedro
ResponderExcluirConcordo com você, Pedro.
ResponderExcluirUm abraço, meu querido.
Caro William, agradeço pelo acompanhamento no blog.
ResponderExcluirabraços, Pedro.
Pedro, eu não acompanhei antes por que acreditava que já o vazia.
ResponderExcluirUm abraço!
William... sabe qual é o próximo livro que eu vou ler???? Um que acabou de chegar na minha casa... OBRIGADA!!!
ResponderExcluire minha mae falou: vc é chique hein fernanda... ganhando um livro das mãos do próprio escritor... Acho que ela vai querer ler tb.. BEIJO!
ResponderExcluirPor nada, Fernanda. Espero que o livro atenda as suas expectativas.
ResponderExcluirQuanto ao chique, você puxou o humor da sua mãe?
Um beijo, m'a bela!