― Mas o que é isso? ― você se pergunta, e logo em seguida começa a ler o escrito.
O texto parece interessante e vai lhe pegando, lhe dominando, lhe levando cada vez mais para dentro da história; nesse momento já esqueceu o churrasco; o conto é sedutor, sedutor até você descobrir que a história se passa num banheiro público e trata de uma superstição japonesa sobre espíritos e fantasmas que habitam os banheiros ².
― Meu Deus ― você chora ―, é um conto de terror! E eu estou num banheiro!
Sim, você está num banheiro, e só há duas coisas na vida que lhe fazem borrar as calças: anacondas e histórias de terror. Que bom que você ainda não havia vestido as calças. O conto diz que algumas das vítimas foram mortas enquanto tomavam banho, ou pior, enquanto estavam sentadas no trono – vaso sanitário, para os menos íntimos.
― Ah meu Deus ― você geme ―, preciso sair daqui, mas como vou me limpar com esse papel, como vou passar essa coisa em mim? Não, não, mamãe, tô com medo ― você parece uma bichinha de tão apavorado.
Mas o momento é de tensão. É difícil, depois de ler uma história assustadora ainda ter que fazer uso do produto onde se encontra o terror. Principalmente com a mão tremendo tanto, como controlar-se para não se sujar todo? Escatologia pura. Nesse momento você encontra, no final do conto, o nome do escritor, Koji Suzuki, e se lembra que é o mesmo autor da trilogia “Ring” que deu origem ao filme “O chamado”.
― Ah filho duma égua, não tinha outro lugar para escrever essa porcaria? ― você grita, já desesperado, ― Porco imundo! Por que eu tinha que encontrar essa droga de papel? Bosta, merda ― e por aí seguem seus xingamentos que, na verdade, têm tudo a ver com o que você está fazendo no banheiro.
Mas a vida tem que continuar e a limpeza têm que ser feita. Rezando trinta e duas “Ave-Marias”, em quarenta segundos, e dezessete “Salve a rainha”, em um minuto, você faz o Sinal da cruz, fecha os olhos, trava os dentes, pede a Deus para não deixar nenhum espírito lhe puxar pelo traseiro para dentro do vaso e termina o serviço...
Não foi tão mal. Não foi tão mal até você ouvir um ronco estranho saindo das profundezas escuras do vaso sanitário, o que lhe fez acreditar que poderia ter competido nos cem metros rasos da Olimpíada passada. Fruto da sua imaginação fértil e conturbada pelo texto; não havia nada no vaso, e você, com esse corpo de biriteiro, não seria competitivo nem em corrida de anão. Mas de quem é a culpa de tudo isso? Do seu intestino frágil e da empresa Hayashi Paper Corp que, em parceria com Koji Suzuki, bolaram essa idéia desumana de imprimir histórias de terror, sobre espíritos em banheiros, num rolo de papel; eles não sabem que algumas pessoas poderiam enfartar sentadas no vaso? Imaginem o ridículo nos jornais: “Um belo jovem, de nome Regisvaldo, morreu enquanto defecava no banheiro de amigos que se divertiam num churrasco”. Só em ver minha morte ligada à palavra “defecava” já me causa depressão. Onde esse mundo vai parar, se um homem sensível não pode nem mais fazer suas obras em paz?
¹ Os personagens e os fatos apresentados nessa história são fictícios, mas o papel higiênico com conto de terror é verdadeiro, inclusive o nome do conto com o espírito que habita a privada e o autor do texto. O escritor e a indústria japonesa citada acima conceberam esse papel como forma de divulgar a Literatura. O que você acha? Gostou da idéia? Se gostou, não perca tempo, encomende o seu e tenha bons momentos no banheiro, a diversão custa cerca de US$ 2 por rolo.
² Notícia veiculada pela BBC Brasil.
Imagem: Divulgação
Pior que um conto com anacondas só mesmo um conto de "como o casal se conheceu" no papel higiênico de um casamento que eu fui aqui na Espanha...
ResponderExcluirFernanda,
ResponderExcluirDeve ter sido muito romântico.
Isso tocou meu coraçaão! <3
ResponderExcluirMatheus, o meu também...
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