19/05/2017

maio 19, 2017

"Desceu sobre nós a mais profunda e a mais mortal das secas dos séculos - a do conhecimento íntimo da vacuidade de todos os esforços e da vaidade de todos os propósitos."
(Barão de Teive - heterônimo de Fernando Pessoa)¹

O aforismo acima, de Fernando Pessoa, apesar de escrito há cerca de um século, vem bem a calhar com nossos dias, sobretudo no nosso país. Lutamos dia após dia – não são todos, infelizmente, nem sei se são muitos ou o bastante – para termos um lugar melhor para vivermos; enxergamos uma luz no fim do fim do túnel e acreditamos que "Agora vai", mas não vai.

A cada degrau que subimos, descemos dois – ou mais –, a cada grito de “Salve!” a uma parca vitória, ouvimos um riso de escárnio do verdadeiro e desonroso vitorioso – honra é qualidade pouco conhecida entre nós nos dias de hoje.

Como diz o Barão de Teive de Pessoa, estamos sendo tomados aos poucos de uma suspeita – para alguns uma certeza – de que nossos esforços são inúteis e de que tudo o que fazemos, supostamente por nós, por alguém, por um bem comum ou nação, ou mesmo de muitos de nós por nós, não passa de vaidade, de busca por publicidade, nessa atualidade de mundo espetáculo, onde nada vale e nada faço se não me presentear a imagem com o sucesso.

Estar nessa situação não é, com toda a certeza, um acontecimento inédito na história do homem; contudo, ter o conhecimento disso e assim ser invadido e desolado por ele é que é o grande mal de um século – ou seca de um século, como diz Pessoa –; século este tão imberbe, tão jovem, ainda nos seus primeiros descobrimentos.

Mas chegamos aqui. Agora cada um deve decidir por si se se entrega ao mal comum ou se mantém a sua dignidade e caráter de resistência e bem comum.

Somos os afogados que boiam há séculos longe da praia




¹PESSOA, Fernando. Aforismos e afins. São Paulo: Companhia das Letras, 2006. p.35

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